Diretor do Sindbancários Porto Alegre e Região, Luiz Cassemiro, expõe como o Banco cria empresas para rebaixar salários e lucrar mais, enquanto fecha agências
O Santander, um dos maiores bancos do país, tem sido alvo de fortes críticas do movimento sindical por adotar um modelo de terceirização considerado fraudulento. Segundo denúncias, a instituição cria e utiliza empresas de seu próprio conglomerado para contratar trabalhadores que exercem funções típicas de bancários, mas sem os direitos garantidos pela Convenção Coletiva da categoria.
Essa prática, de acordo com o diretor do Sindicato dos Bancários de Porto Alegre e Região (Sindbancários) Luiz Carlos Cassemiro, resulta em jornadas mais longas, salários menores e perda de benefícios históricos, como participação nos lucros, auxílio-creche e estabilidade em situações especiais. Ao mesmo tempo, o banco segue promovendo o fechamento de agências em todo o Brasil, sobretudo em cidades do Interior, o que aprofunda a exclusão bancária e precariza o atendimento à população.
O contraste entre o lucro bilionário registrado pelo Santander no País, que responde por cerca de 20% do resultado global do grupo, e a realidade vivida por trabalhadores e clientes é o que motiva a reação sindical. Em entrevista ao Brasil de Fato RS, o dirigente Luiz Carlos Cassemiro detalha os impactos dessa política e os próximos passos da luta em defesa de direitos e de um atendimento bancário de qualidade.
No mês de julho a situação envolvendo o banco espanhol foi tema de audiência na Câmara dos Deputados. Na ocasião, o banco Santander, que também foi convidado a participar da audiência, não compareceu, enviando apenas uma carta que foi lida no plenário.
Brasil de Fato RS: Poderia explicar como funciona esse modelo de terceirização adotado pelo Santander e por que ele é considerado fraudulento pelos sindicatos?
Luiz Carlos Cassemiro: Nos últimos cinco anos, o banco Santander criou ou adquiriu mais de 30 empresas, que hoje integram seu conglomerado econômico. O Santander transfere trabalhadores da estrutura própria do banco ou contrata para empresas controladas dentro do mesmo grupo econômico, como, SX Tools, Prospera, Pulse Client Experts, F1RST, Toro Asset Management entre outras que possuem Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJs) e CNPAs diferentes, muitas vezes até fora da área financeira.
Mesmo realizando as mesmas funções, inclusive tendo como exigência as mesmas certificações de um bancário que atue dentro de uma agência e hierarquia similares às de antes. Esses funcionários passam a ter contratos regidos por convenções coletivas muito inferiores a da categoria bancária e com carga horaria superior à dos bancários. Esta estratégia do banco reduz salários, Participações dos Lucros e Resultados (PLR), vale-refeição, auxílio-creche entre outros benefícios historicamente conquistados pela categoria bancária.
Dentre as diversas empresas do grupo Santander, cito três coligadas, Pulse Client Expert Ltda, Tools Soluções e Serviços Ltda e Toro Asset Management S.A, todas 100% controle acionário do Santander. Trabalhando exclusivamente para o banco Santander. Ainda que formalmente em outra empresa do grupo econômico, os trabalhadores continuam subordinados ao Santander, com mesma gestão, metas, controle e local de trabalho o que descaracteriza uma terceirização legítima. Por isto consideramos este modelo fraudulento.
Vale ressaltar que estes movimentos do Santander distorcem a base de arrecadação tributária, gerando impacto inclusive para a União, já que os salários e benefícios são mais baixos e, principalmente, desrespeitam o trabalhador, que executa o mesmo serviço, mas com menos garantias.
BdF: Quais são as principais diferenças entre as funções exercidas pelos terceirizados e as de um bancário protegido pela Convenção Coletiva, e que direitos esses trabalhadores acabam perdendo?
Luiz Cassemiro: O bancário atua em atividades típicas de banco, como abertura de contas, concessão de crédito, atendimento ao público, operações financeiras e venda de produtos bancários.
O terceirizado em tese, deveria exercer funções de apoio (telemarketing, segurança, limpeza). Mas, no caso do Santander, estes trabalhadores terceirizados acabam executando atividades típicas de bancário, como venda de produtos financeiros, cobrança de clientes e suporte operacional de agências digitais, só que sem os mesmos direitos.
Um trabalhador contratado como terceirizado (via empresa de prestação de serviços, por exemplo) não tem enquadramento como bancário e, por isso, não se beneficia da Convenção Coletiva dos Bancários, que é uma das mais avançadas do país. Alguns direitos perdidos são:
Jornada de Trabalho: A jornada do bancário é de 6 horas diárias, totalizando 30 horas semanais. A do terceirizado é de 8 horas diárias, com um limite de até 44 horas semanais.
Salário: O bancário recebe o piso salarial da categoria bancária. O terceirizado recebe o piso salarial da categoria de serviços terceirizados.
Participação nos Lucros e Resultados (PLR): Para o bancário, a PLR segue regras próprias definidas na CCT. Para o terceirizado, quando existente, não segue a CCT bancária.
Vale-refeição e Alimentação: Os valores para o bancário são definidos em acordo nacional. Para o terceirizado, os valores são definidos por convenções de serviços terceirizados.
Auxílios: O contrato do bancário inclui auxílios como creche/babá e educação para filhos com deficiência. O contrato do terceirizado normalmente não possui esses auxílios.
Férias: O bancário tem direito a 30 dias de férias acrescidos de um abono de 1/3. O terceirizado tem direito às férias previstas na CLT.
Licenças: As licenças maternidade e paternidade do bancário são ampliadas pela CCT. As do terceirizado seguem os prazos da CLT.
Saúde e Previdência: O bancário tem acesso a planos de saúde e previdência complementar negociados. Para o terceirizado, esses benefícios geralmente não são oferecidos ou são mais restritos.
Proteção Sindical: O bancário é amparado pela Convenção Coletiva dos Bancários. O terceirizado não possui a proteção desta convenção.
Estabilidade: O bancário possui estabilidade em casos de pré-aposentadoria, retorno de licença médica e para gestantes. O terceirizado não possui essas estabilidades específicas.
BdF: Qual tem sido o impacto do fechamento de mais de 450 agências do Santander, especialmente nas comunidades do Interior? O sindicato tem recebido denúncias de precarização do atendimento por parte de trabalhadores ou clientes?
Luiz Cassemiro: O fechamento em massa de agências tem consequências sérias, especialmente no Interior e em comunidades menores. Desemprego e sobrecarga, cada agência fechada representa cortes de postos de trabalho. Quem permanece é transferido para outras unidades e sofre sobrecarga, gerando adoecimento físico e mental. Estamos recebendo diversos relatos de adoecimento como síndrome de burnout, estresse e depressão.
Percebe-se uma exclusão bancária, idosos, aposentados e pessoas sem acesso à internet ficam sem atendimento presencial, tendo que viajar quilômetros até a agência mais próxima. Clientes são empurrados para o uso de aplicativos e centrais terceirizadas, sem suporte adequado, aumentando a frustração. Em pequenas cidades, a saída do banco representa perda de circulação financeira e impacto no comércio local.
“Nossos próximos passos serão a combinação de todas as frentes de luta” – Foto: Laís Escher / SindBancários
O sindicato têm registrado denúncias dos trabalhadores, como aumento de metas e acúmulo de funções após absorver clientes de agências fechadas. Jornadas mais longas e pressão constante para vender produtos, bater as metas muitas vezes intangíveis. Estamos recebendo diversos relatos de adoecimento como síndrome de burnout, estresse e depressão.
Por parte dos clientes temos recebido reclamações como duas ou três horas para serem atendidos nas agências que ficaram abertas. Clientes idosos reclamam de que são direcionados apenas para o aplicativo ou caixa eletrônico. Reclamações de que a qualidade do atendimento caiu muito após a substituição de bancários por terceirizados ou correspondentes.
O fechamento das agências gera lucro para o banco e prejuízo social, tanto para os trabalhadores quanto para a população. O sindicato tem sido porta de entrada para organizar essas denúncias e transformá-las em luta contra essa política de precarização.
BdF: Como o sindicato avalia a tentativa do Santander de se desvincular do Banesprev? Quantas pessoas podem ser afetadas e o que isso significa para os aposentados que dependem do fundo de pensão?
Luiz Cassemiro: Desde 2022, o movimento sindical vinha denunciando que a tentativa do Santander de se desvincular do Banesprev era um ataque direto aos direitos históricos dos trabalhadores do antigo Banespa, conquistados com muita luta.
O banco queria se desresponsabilizar da gestão e do custeio do fundo, deixando de assumir seu papel de patrocinador. Isso iria enfraquecer a segurança previdenciária de milhares de trabalhadores e aposentados.
O movimento sindical segue atento aos movimentos do Santander
Para o sindicato, esta era uma medida que faz parte da mesma lógica de precarização, aumentar o lucro do banco às custas da retirada de direitos de quem construiu a história da instituição.
Hoje, o Banesprev possui cerca de 16 mil participantes, entre ativos, aposentados e pensionistas, vinculados a diferentes planos. Todos eles poderiam ser impactados, pois a saída do Santander colocaria em risco a sustentabilidade do fundo.
Recentemente obtivemos uma grande vitória para os assistidos do Banesprev, a Previc – Superintendência Nacional de Previdência Complementar indeferiu todos os seis pedidos de retirada de patrocínio dos planos de benefícios definidos (Banesprev I e II, DAB, DCA, Caciban e Sanprev I) por não cumprirem todas as condições para o licenciamento em conformidade com os padrões normativos. O movimento sindical segue atento aos movimentos do Santander.
BdF: Diante desse cenário, quais serão os próximos passos do movimento sindical? Existe a possibilidade de ações judiciais, greves ou outras formas de pressão?
Luiz Cassemiro: Diante da escalada de precarização promovida pelo Santander com terceirizações fraudulentas, fechamento de agências, demissões e ameaça contra o Banesprev o movimento sindical jamais vai se calar. Nossos próximos passos serão a combinação de todas as frentes de luta, ações judiciais e administrativas, acionar o Ministério Público do Trabalho, exigindo fiscalização e responsabilidade do banco.
Já estamos buscando apoio parlamentar e órgãos públicos para denunciar a postura do Santander. Estamos organizando audiências públicas estaduais e federal para ampliar o debate sobre o impacto social do fechamento de agências e da exclusão bancária.
A riqueza deve ser construída com justiça, e não com exploração e exclusão.
Seremos incansáveis para barrar as irregularidades, precisamos fazer pressão política e institucional para que o banco cumpra seus compromissos.
O Santander precisa entender que enquanto atacar seus trabalhadores, encontrará resistência organizada e firme do nosso movimento sindical.
BdF: Considerando que o Brasil responde por cerca de 20% do lucro mundial do Santander, como o senhor avalia o contraste entre esses lucros e as denúncias de precarização, e que mensagem o sindicato quer deixar para a sociedade?
Luiz Cassemiro: É totalmente inaceitável que o Santander registre lucros bilionários no Brasil, cerca de 20% do seu lucro global, enquanto seus trabalhadores enfrentam terceirizações fraudulentas, adoecimento, fechamento de agências e ameaças aos direitos conquistados. Esse contraste mostra claramente que o banco prioriza o lucro acima da dignidade de quem constrói sua riqueza.
O sindicato quer deixar uma mensagem clara à sociedade, quem produz o lucro não pode ser explorado, e o atendimento à população não pode ser precarizado. É preciso responsabilizar o Santander por suas práticas e defender direitos, empregos e serviços de qualidade. Nós vamos lutar para que o banco respeite trabalhadores e clientes, mostrando que a riqueza deve ser construída com justiça, e não com exploração e exclusão.
Fonte: Brasil de Fato